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Segundo o preso político Jaime Serra, aí eram aplicados os castigos mais arbitrários, desde o corte de correspondência e de visitas, até ao isolamento nas salas e «celas disciplinares» durante meses seguidos.

Em Caxias os presos eram encerrados frequentemente durante dias a fio «em casamatas lodosas, sem ar nem luz». Em 1960, o detido Carlos Aboim Inglês sofreu uma das mais duras punições, ao ser encerrado, durante cinco dias, num «dos piores “segredos” que havia em Caxias»: a casamata subterrânea. Em 1961, um documento interno do PCP deu conta que cerca de cento e cinquenta camponeses alentejanos tinham sido encerrados nessas casamatas, onde chovia e faltava o ar, a luz e as condições mínimas de higiene.

A assistência médica era deficiente e estava a cargo de médicos que eram também funcionários da PIDE. O Reduto Sul foi também utilizado até fins de 1962 como hospital-prisão, sob a tutela do Ministério da Justiça. Deixou de funcionar nessa data, quando foi inaugurado o Hospital de São João de Deus, também em Caxias.

Era frequente a PIDE recusar a hospitalização dos doentes, que permaneciam em salas sobrelotadas juntamente com os presos saudáveis.

Após uma fuga coletiva de Caxias em 1961, os presos doentes deixaram de ser enviados ao hospital-prisão, optando a PIDE por chamar médicos do exterior.

Parte do Forte de Caxias onde eram torturados os presos da PIDE-DGS. Fonte: ANTT, FLAMA.  Parte do Forte de Caxias onde eram torturados os presos da PIDE-DGS. Fonte: ANTT, FLAMA. 
Corredor do Forte de Caxias onde se encontrava um arquivo pertencente à PIDE-DGS. Fonte: ANTT, Flama Corredor do Forte de Caxias onde se encontrava um arquivo pertencente à PIDE-DGS. Fonte: ANTT, Flama

Quanto à alimentação, a quantidade e qualidade eram piores do que nas prisões comuns, sendo servido carne e peixe em mau estado. Apesar de haver um refeitório na cadeia, a maioria dos presos eram obrigados a comer nas casernas em péssimas condições higiénicas ou nas salas. Os que iam ao refeitório tinham de sentar-se de costas uns para os outros e nem sequer podiam cumprimentar-se.

Embora, segundo a Reforma Prisional de 1936, os presos políticos pudessem corresponder-se livremente, a PIDE só o permitia com familiares chegados e, mesmo assim, vigiava a correspondência. Em meados da década de sessenta, a direção da cadeia exigiu que os envelopes não contivessem as expressões «preso político» no remetente ou «cadeia política» no destinatário. Era esta a forma encontrada para negar a existência de presos políticos em Portugal. Os presos só podiam escrever duas folhas por carta e, no caso de um casal preso, a mulher só podia escrever ao marido duas folhas por semana.

O regulamento prisional privativo da PIDE estabelecia que os presos políticos só podiam receber a visita dos pais, mães, irmãos, filhos, avós e tios de 1.º grau, desde que estes não tivessem estado também detidos por razões políticas. Estavam excluídos os companheiros e companheiras não casados. No final do salazarismo, as visitas em comum com as famílias eram espaçadas de dez meses a um ano – antes, podiam ocorrer de três em três meses. Foram ainda proibidas as visitas entre sobrinhos e tios. Todas as conversas entre o preso e familiares eram escutadas. As visitas dos advogados realizavam-se num parlatório vulgar, com um vidro a separar o detido do advogado, o que inibia a consulta do processo.

"Solidariedade com os presos políticos anti-fascistas. Movimento de Unidade Anti-Fascista da Zona Ocidental de Lisboa", s.d., Fundação Mário Soares / Alberto Pedroso

O recreio, para dez a doze presos, ocorria numa sala sem teto e com chão de mosaico, que media 8,5 x 7,5 metros. Embora a Reforma Prisional de 1936 estabelecesse a obrigatoriedade de um passeio ao ar livre de pelo menos uma hora diária, a PIDE concedia-o apenas durante meia hora, de quatro em quatro dias.

O parlatório tinha dez cabines divididas com paredes forradas a azulejos, que isolavam os presos uns dos outros. O detido ou detida ficava também separado dos visitantes por uma espécie de balcão com altura de uma mesa, no meio do qual estava fixada uma placa de vidro até ao teto.

 

Os presos apenas tinham acesso aos jornais O Século e O Primeiro de Janeiro, que mais tarde seriam substituídos pelo Diário da Manhã. Dispunham apenas de livros da 4.ª classe e alguns romances. Os livros de História, Filosofia, Economia, Sociologia e os Atlas e as Enciclopédias eram proibidos. Nos anos finais do regime deixou de se poder realizar na prisão exames escolares.

Era proibido falar, rir, assobiar alto, cantar, deitar-se ou sentar-se na cama fora de horas de repouso e ensinar os companheiros. Os gira-discos, proibidos nas celas masculinas, passaram também a sê-lo para as mulheres a partir da Páscoa de 1967.

A cadeia de Caxias era particularmente penosa para as presas, que aí passavam todo o período de detenção preventiva e durante o cumprimento da pena e das medidas de segurança.
As presas estavam divididas duas a duas, em salas com casa de banho, e assim viviam em convivência forçada por meses e anos. Apenas saíam da cela para o recreio diário de duas horas, mas com a mesma e única companheira. Tal situação levava à falta de privacidade e a um «crescente número de doenças nervosas». Algumas presas tinham com elas os filhos pequenos ou nascidos durante a detenção. As refeições também eram tomadas na cela. O único contacto das presas com o exterior era durante as visitas da família, num parlatório, com um vidro de permeio, onde não tinham possibilidade de abraçar ou beijar os filhos. Visitas em comum só existiam na data dos aniversários e no Natal e na Páscoa.

 

Em 1964, o ministro do Interior considerou necessária a transferência dos Serviços de Investigação da PIDE da Rua António Maria Cardoso para o Reduto Sul de Caxias, não só por motivos de segurança como devido à má impressão que causava o «vaivém» do transporte dos presos nas ruas centrais de Lisboa.

O encerramento da Cadeia do Aljube, em 1965, e a necessidade de transferir para Caxias a população nele encarcerada levou a obras no Reduto Norte, onde foram instaladas novas celas coletivas e de isolamento. Durante o período das obras – cerca de três anos – foram colocados dezoito detidos em cada sala do Reduto Sul com capacidade para dez pessoas.

#50anos25abril