As Campanhas de Dinamização Cultural e Ação Cívica do MFA procuraram identificar as principais carências das populações e, simultaneamente, atuar diretamente num conjunto de dimensões, nas quais a expressão artística assumia um papel importante instrumento para a emancipação do povo.
Nesta medida, foram organizadas diversas ações abrangendo um largo espectro de atividades culturais (e não só), como a projeção de filmes, a encenação de peças de teatro e outras formas de animação cultural.
Nas Campanhas participaram numerosas companhias como a Casa da Comédia, o Teatro da Cornucópia, o Teatro Nosso Tempo, o Teatro Experimental de Cascais, o Teatro Villaret, o Teatro Estúdio de Lisboa, Os Bonecreiros, a Comuna, o Grupo 4, o Teatro Maria Matos, o Teatro Hoje, Feira Ladra, Cómicos, Água, Gás e Eletricidade, Bonecos de Santo Aleixo, Graça Lobo e Manuel Crespo.
As peças de teatro eram normalmente sucedidas por debates sobre os temas abordados em cena. São exemplos de obras representadas nestes contextos, «As Espingardas da Mãe Carrar» de Bertolt Brecht ou a «Traição do Padre Martinho» de Bernardo Santareno.
Foram ainda criados novos textos dramáticos para serem encenados no quadro da Campanhas, como é o caso de «O Segredo de Montemuro», texto do dramaturgo brasileiro Alfredo Nery Paiva, escrita a partir da história da construção de uma estrada em Castro Daire, em que o vilão é o cacique local, a heroína uma professora da terra e o agente de mudança o chefe da dinamização cultural.
Estreia da peça «As espingardas da mãe Carrar», de Bertolt Brecht, na Casa da Comédia. 15 de janeiro de 1975. Fonte: ANTT, EPJS
Ensaio da peça «A traição do padre Martinho» no Teatro Maria Matos. 14 de setembro de 1974. Fonte: ANTT, EPJS
Beneficiando do facto de Vasco Pinto Leite, diretor-geral da Cultura Popular e Espetáculos, ter sido cineclubista e presidente da Federação Portuguesa de Cinema, o cinema foi um dos meios mais utilizados nas Campanhas de Dinamização Cultural.
Aliás, a partir de maio de 1974 e até ao início das Campanhas, tinha já havido um projecto de brigadas móveis de cinema popular, criado por Manuel Begonha e Ramiro Correia, ambos futuros membros da CODICE.
O reportório cinematográfico das Campanhas de Dinamização era vasto, indo desde filmes como a «Canção de Lisboa» (Cottinelli Telmo, 1933) e «Charlot Agiota» (Charlie Chaplin, 1916) até filmes politicamente engajados como «Las Hurdes: Tierra Sin Pan» (Luis Buñuel, 1933), onde é exposta a miséria na região de La Hurdes, área rural de Espanha; «L’ Espoir» (André Malraux, 1937), que relata a luta dos combatentes republicanos na Guerra Civil de Espanha ou «La Tierra Prometida» (Miguel Littin, 1974), centrado na luta dos camponeses chilenos pelo estabelecimento da revolução socialista.
O sector da música das Campanhas foi coordenado por Carlos Andrade, Carlos Paredes e Sílvio Pleno. Foram promovidos concertos com as Orquestras Sinfónicas de Lisboa e do Porto, a Orquestra Gulbenkian e a Orquestra Sinfónica da Emissora Nacional. Na área da música de intervenção, destaca-se a participação de nomes como José Afonso, Adriano Correia de Oliveira, Luís Cília, Manuel Freire, Francisco Fanhais, Pedro Barroso e José Jorge Letria. Do ponto de vista da dança, o Ballet Gulbenkian também colaborou com o MFA, atuando em algumas ocasiões.
A dança e a música foram, contudo, áreas para as quais convergiram de forma relevante as formas mais locais de expressão cultural, incluindo bandas filarmónicas ou ranchos folclóricos que animavam as Campanhas de dinamização cultural. Na mesma senda, vários grupos corais (como o Orfeão Universitário do Porto, o Coral de Barcelos ou os Cantadores de Castro Daire) e bandas civis e militares participaram nas Campanhas.
No âmbito das Campanhas de Dinamização Cultural, foi ainda elaborado um programa de formação musical, que incluía a divulgação de um novo método de aprendizagem de guitarra portuguesa.
O circo ocupava um sector próprio no âmbito da organização das Campanhas, que foi dirigido por Francisco Faria Paulino e Teresa Ricou (Tété). Outros artistas, como Carlos da Costa Monteiro, a Família Jacques, Luciano Nobre, ou grupos, como os Palhaços do Inatel, os Palhaços de Viseu, os Fantoches de Francisco Esteves, foram chamados a participar. Para além dos vários espetáculos dinamizados, foi ainda criada uma Cooperativa de Circo, no Muxito, Seixal.
A Dinamização Cultural tinha também uma secção de artes plásticas, que desenvolveu várias atividades coletivas, como a pintura mural, a produção de cartazes e autocolantes, bandas desenhadas e selos. Neste âmbito, destaca-se a participação de artistas plásticos como João Abel Manta, Marcelino Vespeira, Artur Rosa e José Aurélio, entre muitos outros.
Reprodução em postal do cartaz «Com a revolução pela Cultura». Desenho de Justino Alves. 1974. Fonte: FMSMB, Fundo Paulo Barral.
Cartaz «MFA, Sentinela do Povo». Desenho de João Abel Manta. 1975. Fonte: FMSMB, Fundo Documentos Ana Coucello.
Cartaz «Poder Popular, Unidade Revolucionária». Desenho de Marcelino Vespeira. 1975. Fonte: FMSMB, Fundo Paulo Barral.
Sendo o setor da literatura coordenado por Modesto Navarro, as ações de dinamização cultural incluíam momentos de leitura e recitais de poesia, com a participação de Papiníano Carlos, Egito Gonçalves, Denis Jacinto, Virgílio Martinho, Bernardo Santareno, Isabel da Nóbrega, António Torrado, Luso Soares e Maria Carrilho.
As Campanhas de Dinamização Cultural não se limitaram a iniciativas de natureza cultural. Entre muitas outras ações, foram ainda elaborados levantamentos das necessidades das populações, realizadas melhorias ao nível das acessibilidades, organizadas equipas sanitárias – que davam consultas gratuitas à população – e equipas veterinárias militares – que procederam à inspeção e vacinação de animais.
Notemos ainda a relevância destas campanhas na recuperação de infraestruturas, como a abertura de estradas, permitindo acessos mais fáceis a localidades cronicamente isoladas, ou a criação de parques infantis e a promoção da prática desportiva, em parceria com a Direção Geral dos Desportos.