Depois de quase meio século de ditadura, a 25 de abril de 1975 os portugueses foram às urnas. Dos 6,2 milhões de eleitores recenseados, 91,7% votaram, elegendo os deputados que iriam preparar e aprovar a nova Constituição. Esta mobilização permanece um recorde nacional.
A Constituição da República Portuguesa, aprovada no dia 2 de abril de 1976, veio garantir os direitos fundamentais dos cidadãos e estabelecer os princípios basilares da democracia, assegurando o primado do Estado de Direito democrático. Foi a base para a construção de um país mais livre, mais justo e mais fraterno. Tornou-nos cidadãos. Deu-nos direitos e deveres. Deu-nos poder.
Não foi sempre assim. Durante os 48 anos que durou a ditadura (1926-1974), os portugueses viveram condicionados por uma longa lista de proibições legais e de preceitos morais. O conservadorismo e o subdesenvolvimento eram elogiados pelo discurso oficial. Vivia-se num clima de medo, um poderoso instrumento político de controlo, que promovia a autocensura.
Aos jovens, o futuro estava vedado: pela Guerra que Portugal travava em África, contra o desejo de autodeterminação dos povos colonizados; por um acesso muito limitado à educação, à saúde e, em muitos casos, à habitação; pela pobreza, que afetava uma parte considerável da sociedade portuguesa; pelo isolamento crescente do país na cena internacional.
No momento em que, a 25 de Abril de 1974, um grupo de jovens capitães desencadeou um golpe de Estado que, em menos de 24 horas, derrubou a ditadura, o rumo da história nacional mudou decisivamente. Iniciou-se um caminho de profundas transformações económicas, sociais e culturais. O país democratizou-se e europeizou-se. Por isso, hoje podes escolher. Tens deveres. Tens direitos. Podes participar, falar, colaborar, criar, aprender, divergir, amar. Numa democracia, #TensPoder. E podes decidir o que fazer com ele.
Aqui podes saber mais sobre alguns dos poderes e deveres que a democracia te dá. Escolhe um e reflete sobre ele. Escreve, filma, fotografa. Partilha as tuas ideias e usa #TensPoder e #50anos25deAbril nas tuas publicações.
Identifica a Comissão Comemorativa 50 anos 25 de Abril (Facebook | Twitter | Instagram )
#PARTICIPAR
Em democracia, tens o poder de participar. Podes votar – é um direito e um dever. Podes também ser eleito.
#TensPoder para escolher quem te representa, e podes candidatar-te a ser um representante. Podes participar em partidos políticos e candidatar-te a cargos públicos.
#TensPoder para contribuir para a democracia do teu país.
Durante a ditadura (1926-1974), o voto era fortemente limitado. Votar era um privilégio reservado a quem sabia ler e escrever, salvo algumas exceções – nessa altura cerca de 26% da população portuguesa era analfabeta. As mulheres alfabetizadas só conquistaram o direito ao voto nos anos finais da ditadura.
Em 1973, Portugal tinha 8,6 milhões de habitantes. Apenas 2 milhões podiam votar e apenas 1,4 milhões o faziam. Depois do 25 de Abril, quando se realizaram as primeiras eleições livres, havia 6,2 milhões de eleitores recenseados. 91,7% participaram.
Foi a conquista da democracia que deu a todos os portugueses o poder – e o dever – de participar.
1. Todos os cidadãos têm o direito de tomar parte na vida política e na direção dos assuntos públicos do país, diretamente ou por intermédio de representantes livremente eleitos.
1. Têm direito de sufrágio todos os cidadãos maiores de dezoito anos, ressalvadas as incapacidades previstas na lei geral.
2. O exercício do direito de sufrágio é pessoal e constitui um dever cívico.
1. Todos os cidadãos têm o direito de acesso, em condições de igualdade e liberdade, aos cargos públicos.
1. A liberdade de associação compreende o direito de constituir ou participar em associações e partidos políticos e de através deles concorrer democraticamente para a formação da vontade popular e a organização do poder político.
#FALAR
Em democracia, tens o poder falar e de exprimir as tuas opiniões. Está garantida a liberdade de pensamento, expressão e informação.
#TensPoder para dizer o que pensas, mesmo que discordes das opiniões maioritárias. Tens voz. Podes informar-te livremente e pensar diferente. Tens o dever de fazê-lo com verdade e respeitando os outros.
Os portugueses viveram sem estes direitos durante quase meio século. Durante a ditadura (1926-1974), a imprensa, o teatro, o cinema, a música, a literatura e as artes plásticas eram alvo de censura. Os cidadãos não eram livres de expressar a sua opinião, nem de escolher que música ouvir ou que discos ler: havia discos e livros proibidos. Os comportamentos eram fortemente vigiados. Vivia-se um clima de medo, que funcionava como poderoso instrumento político de censura, incluindo a autocensura, e de controlo.
Foi a conquista da democracia que deu a todos os portugueses o poder de se expressarem livremente – e o dever de o fazerem com verdade, responsabilidade e respeito.
1. Todos têm o direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de informar, de se informar e de ser informados, sem impedimentos nem discriminações.
1. É garantida a liberdade de imprensa.
1. Os cidadãos têm o direito de se reunir, pacificamente e sem armas, mesmo em lugares abertos ao público, sem necessidade de qualquer autorização.
2. A todos os cidadãos é reconhecido o direito de manifestação.
#COLABORAR
Em democracia, tens o poder de colaborar e participar. Tens o poder de lutar pela mudança em colaboração com os outros – e o dever de fazê-lo respeitando os que pensam e fazem diferente de ti. Podes fundar uma associação, um partido, uma comissão de trabalhadores. Podes juntar-te aos que já existem.
#TensPoder para fazer a mudança em conjunto com outros cidadãos e para apresentar as tuas ideias.
Durante a ditadura (1926-1974), a mobilização cívica dos portugueses foi fortemente limitada pelo regime. Existiam, por exemplo, inúmeros entraves às reuniões e ajuntamentos. As reuniões de natureza política e social tinham de ser autorizadas pelos governos civis, que podiam suspender esses encontros ou interromper quem falava sempre que lhes parecesse que infringiam a lei. A constituição de associações – de caráter político, sindical, cultural, desportivo, recreativo, sociais, etc. – carecia de autorização do governo, que deveria aprovar os seus estatutos e homologar os corpos gerentes. Os partidos políticos eram ilegais. Os que existiam agiam na clandestinidade e os seus membros arriscavam-se a ser presos e torturados – muitos foram. Só eram toleradas manifestações desportivas e religiosas, ou de apoio ao regime. Muitos protestos acabaram com forte repressão policial, detenções, tortura e deportações.
Foi a conquista da democracia que deu a todos os portugueses o poder de se reunirem e associarem – e o dever de o fazerem com verdade, responsabilidade e respeito.
1. Os cidadãos têm o direito de, livremente e sem dependência de qualquer autorização, constituir associações, desde que estas não se destinem a promover a violência e os respetivos fins não sejam contrários à lei penal.
1. A liberdade de associação compreende o direito de constituir ou participar em associações e partidos políticos e de através deles concorrer democraticamente para a formação da vontade popular e a organização do poder político.
1. É direito dos trabalhadores criarem comissões de trabalhadores para defesa dos seus interesses e intervenção democrática na vida da empresa.
1. Todos os cidadãos têm o direito de apresentar, individual ou coletivamente, aos órgãos de soberania, aos órgãos de governo próprio das regiões autónomas ou a quaisquer autoridades petições, representações, reclamações ou queixas para defesa dos seus direitos, da Constituição, das leis ou do interesse geral e, bem assim, o direito de serem informados, em prazo razoável, sobre o resultado da respetiva apreciação.
#CRIAR
Em democracia, tens o poder de criar sem medo de censuras ou punições. És livre para promover a criação intelectual, artística e científica. Podes criar a tua associação ou a tua empresa.
#TensPoder para idealizar, descobrir, inovar.
#TensPoder para fazer a mudança em conjunto com outros cidadãos e para apresentar as tuas ideias.
Durante quase meio século, os portugueses viveram privados destes direitos. Existia censura, um dos mais poderosos instrumentos do aparelho repressivo do regime do Estado Novo (1926-1974). Os meios de comunicação não eram livres de relatar os acontecimentos. A ditadura censurava quaisquer notícias que pudessem afetar o bom nome do regime, agitar a opinião pública ou atentar contra «a moral e os bons costumes». Os cidadãos não eram livres de expressar a sua opinião. O regime proibia discos e livros. Jornalistas, editores, artistas e escritores foram acusados e detidos. Editoras foram multadas e encerradas. A constituição de associações exigia a autorização do governo: era o regime que aprovava os seus estatutos e homologava os corpos gerentes. As empresas de algumas indústrias – como indústrias químicas ou alimentares – tinham de obedecer ao regime de condicionamento industrial, que sujeitava a criação de novos negócios à concordância das suas concorrentes. O Estado podia proibir o investimento em determinado setor.
Foi a conquista da democracia que deu a todos os portugueses o poder de darem forma às suas ideias.
1. É livre a criação intelectual, artística e científica.
2. Esta liberdade compreende o direito à invenção, produção e divulgação da obra científica, literária ou artística, incluindo a proteção legal dos direitos de autor.
1. A iniciativa económica privada exerce-se livremente nos quadros definidos pela Constituição e pela lei e tendo em conta o interesse geral.
#APRENDER
Em democracia, tens o poder de aprender e de ensinar. Tens direito à educação e à cultura.
#TensPoder para defender e valorizar o património cultural.
Até ao 25 de Abril, a Educação era um privilégio de uma minoria e não um direito de todos os cidadãos. Em 1970, 26% da população portuguesa era analfabeta. Destes 1,8 milhões de portugueses que não sabiam ler nem escrever, 64% eram mulheres. Hoje, a taxa de analfabetismo é de 3%. No final da ditadura, apenas 8% das crianças frequentavam o pré-escolar. Hoje, essa etapa é uma realidade para mais de 90% dos que têm entre 3 e 5 anos. A frequência dos 2.º e 3.º ciclo e Secundário era reservada a uma minoria da população: 26%, 18% e 5%, respetivamente. Hoje, 91% dos jovens entre os 10 e os 11 anos frequentam o 2.º ciclo; 94% entre os 12 e os 15 frequentam o 2.º ciclo; e 88% entre os 15 e os 17 anos frequentam o Ensino Secundário.
Em 1970, menos de 1% da população com 15 ou mais anos tinha Educação Superior. Em 2021, 20% da população alcançara este nível de ensino, sendo 60% mulheres.
Foi a conquista da democracia que permitiu que a Educação se democratizasse.
1. É garantida a liberdade de aprender e ensinar.
2. O Estado não pode programar a educação e a cultura segundo quaisquer diretrizes filosóficas, estéticas, políticas, ideológicas ou religiosas.
1. Todos têm direito à educação e à cultura.
2. O Estado promove a democratização da educação e as demais condições para que a educação, realizada através da escola e de outros meios formativos, contribua para a igualdade de oportunidades, a superação das desigualdades económicas, sociais e culturais, o desenvolvimento da personalidade e do espírito de tolerância, de compreensão mútua, de solidariedade e de responsabilidade, para o progresso social e para a participação democrática na vida coletiva.
1. Todos têm direito ao ensino com garantia do direito à igualdade de oportunidades de acesso e êxito escolar.
1. Os professores e alunos têm o direito de participar na gestão democrática das escolas, nos termos da lei.
1. Todos têm direito à fruição e criação cultural, bem como o dever de preservar, defender e valorizar o património cultural.
#DIVERGIR
Em democracia, tens o poder de divergir. Tens direito a ser diferente dos outros. Nenhuma pessoa pode ser discriminada com base em critérios como raça, género ou religião.
#TensPoder para ser diferente e o dever de respeitar quem é diferente de ti pela sua aparência, por aquilo em que acredita, ou pelas suas opções.
Durante a ditadura (1926-1974), o regime incentivava o pensamento único. Existiam organizações de enquadramento ideológico, como a Mocidade Portuguesa, a Legião Portuguesa, o Secretariado de Propaganda Nacional (Secretariado Nacional de Informação depois de 1945), a Fundação Nacional para a Alegria no Trabalho e a Obra das Mães pela Educação Nacional. As opiniões contrárias eram severamente punidas. Muitos pagaram com a vida essa divergência: foram presos, torturados, assassinados.
Vigorava um sistema de partido único – a União Nacional, depois Ação Nacional Popular. As oposições tiveram uma intervenção política sempre muito limitada. Só eram toleradas manifestações desportivas e religiosas, ou de apoio ao regime. As restantes eram severamente reprimidas. O regime criou uma polícia política – primeiro PVDE, depois PIDE e DGS – com vastos poderes, que procedia a detenções arbitrárias, sem culpa formada, e praticava a tortura. Existiam tribunais especiais para crimes políticos (tribunais plenários) e estabelecimentos prisionais de natureza política (como as prisões do Aljube, Caxias ou Peniche).
A homossexualidade era proibida, e considerada uma doença mental. Os homossexuais podiam ser detidos, torturados e humilhados. Foi a conquista da democracia que deu a todos os portugueses o poder de serem diferentes e o dever de respeitarem a diferença.
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual (Artigo 13.º, Princípio da igualdade)
1. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à proteção legal contra quaisquer formas de discriminação.
1. A liberdade de consciência, de religião e de culto é inviolável.
2. Ninguém pode ser perseguido, privado de direitos ou isento de obrigações ou deveres cívicos por causa das suas convicções ou prática religiosa.
#TRABALHAR
Em democracia, tens o poder para trabalhar livremente. Podes escolher a tua profissão sem te veres limitado pelo teu género, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas. Podes fazer greve para reivindicar melhores condições de trabalho.
#TensPoder para trabalhar livremente, contribuindo para a economia do teu país.
Até ao 25 de Abril, o marido podia opor-se a que a sua mulher assinasse um contrato de trabalho. As mulheres estavam também impedidas de exercer algumas profissões, como a de magistrada ou de diplomata. O escasso acesso à Educação impedia a maioria da população de ascender a empregos qualificados.
Foi apenas em democracia que se criou o salário mínimo nacional, que beneficiou cerca de metade da população ativa; que se instituiu o pagamento do subsídio de Natal e de férias; o pagamento de pensão social para quem não tinha efetuado descontos; e que se universalizou o direito a férias pagas. Durante a ditadura, era proibido fazer greve.
Foi a conquista da democracia que deu a todos os portugueses o poder de trabalhar em liberdade.
1. Todos têm direito ao trabalho.
b) A igualdade de oportunidades na escolha da profissão ou género de trabalho e condições para que não seja vedado ou limitado, em função do sexo, o acesso a quaisquer cargos, trabalho ou categorias profissionais.
1. Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito:
a) À retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna;
1. É garantido o direito à greve.
#AMAR
Em democracia, tens o poder de amar em condições de plena igualdade, sem interferência do Estado. Tens o dever de respeitar as escolhas dos outros.
#TensPoder para te casares e constituir família.
Durante a ditadura (1926-1974), um simples beijo nos lábios era considerado atentado à moral e podia implicar o pagamento de multas. Esperava-se das mulheres que fossem recatadas, e que se mantivessem virgens até ao casamento. Era comum que o namoro se fizesse ao postigo ou na presença de algum membro da família. O aborto era ilegal. As professoras, por exemplo, só podiam casar-se com autorização do ministro.
Quem se casasse pela Igreja não poderia divorciar-se. A homossexualidade era proibida, e considerada uma doença mental. Os homossexuais podiam ser detidos, torturados e humilhados.
Foi a conquista da democracia que permitiu dar a todos os portugueses o poder de amarem quem quiserem sem restrições impostas pelo Estado.
1. Todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei.
2. Ninguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual.
1. Todos têm o direito de constituir família e de contrair casamento em condições de plena igualdade.
3. Os cônjuges têm iguais direitos e deveres quanto à capacidade civil e política e à manutenção e educação dos filhos.