António Correia de Campos testemunhou, enquanto estudante e membro da direção da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, a crise de 1962.
Os acontecimentos recentes em Coimbra e Lisboa levam à radicalização da contestação estudantil.
Num plenário realizado a 7 de maio, é decretado o “luto académico total”, que inclui greve às aulas, frequências e exames de final do ano. Na Faculdade de Ciências de Lisboa, por exemplo, lê-se num cartaz: “Não faltes amanhã, falta já hoje”.
Por sugestão de Eurico Figueiredo, carismático dirigente estudantil de Medicina, é aprovada em plenário uma nova forma de protesto: a greve da fome. Na cantina da Cidade Universitária, 81 estudantes iniciam esta inédita forma de protesto. Num abaixo-assinado, os grevistas assumem uma “posição marcada e IRREDUTÍVEL”, manifestando o seu “mais veemente protesto”.
Estudantes presas durante a greve de fome.
10 de maio de 1962. Fonte: FMSMB-DTR.
Aos 81 grevistas juntam-se, em solidariedade, cerca de 1500 estudantes (e alguns professores) no interior da cantina. O local passa a ser um bastião de resistência. O Senado da Universidade de Lisboa condena a radicalização do movimento e apela à intervenção do Governo de forma não violenta.
Na madrugada do dia 11 de maio, a polícia cerca a cantina e entra nas instalações. Alguns professores, como Luís Lindley Cintra e Francisco Pereira de Moura, tentam servir de mediadores e demonstram o seu apoio aos estudantes. Os estudantes são presos, um a um, incluindo os dirigentes das associações. Muitos são libertados na manhã seguinte, mas alguns são conduzidos à prisão de Caxias. Os acontecimentos alcançam uma repercussão internacional, bem visível na imprensa estrangeira.
Na prisão, um grupo de estudantes presas mantém o protesto: “A nossa atitude de firmeza e de recusa sistemática e geral da comida, como protesto ao facto injustificado de estarmos presas, levou a polícia a propor-nos, insistentemente, durante a tarde, o fornecimento de sandes, que recusámos também”.
Identificação pela PIDE de alguns grevistas de fome.
Fonte: ANTT.ca-PT-TT-PIDE-DGS-Album-Fotos-Presos-8905.
Abílio Teixeira Mendes • Adolfo Steiger Garção • Aguinaldo Alexandre Cabral • Aires Glória Duarte • Alexandre de Gouveia e Abreu • Alfredo Nascimento • Álvaro Ribeiro Mateus • Amândio Gonçalves Cordeiro • António Cardoso da Silva • António da Conceição Bento • António Alves Vieira • António Correia de Campos • António da Cruz Rato • António Jacinto Rodrigues • António José Ferreira • António Ginestal da Cruz • António Montez de Sousa • António Ramos Ribeiro • António Rego Chaves • Augusto José Carvalho Amorim • Bento Quintino de Barros • Carlos Pires da Silva • Duarte Vitorino Marques • Emanuel de Melo Sousa • Ernâni Pinto Basto • Eugénio Pinto Basto • Eurico Figueiredo • Feliciano da Cruz David • Fernando Cortês Pinto • Fernando de Quevedo e Castro • Fernando Vaz Garcia • Henriques Schwarz da Silva • Ilídio Lourenço • Isabel Carlos Simões Diniz • Isabel Vila Maior • Jacinto Carriço • Jaime Filipe Barbosa • João Bívar Segurado • João Carlos Valente • João Cortesão Casimiro • João Rego Santos • João Ribeiro Louro • João Santos Marques • Joaquim Faria Teixeira • Joaquim Ortigão • Joaquim Rebordão Esteves • Jorge Dias de Deus • José António Barata • José Francisco Borrego Rovinha • José Garibaldi Barros Queiroz • José Carlos Carvalhosa • José Luís Boaventura • José Marques Felismino • José Oliveira Calvário • Laura Larcher Graça • Lima Saraiva • Luís Gouveia de Freitas • Manuel Silva Tavares • Manuel Monteiro Magalhães • Manuel Paiva Teixeira • Manuel Vieira Pereira • Maria da Conceição Santinho • Maria Cristina Pereira • Maria Cristina Pereira • Maria Emília Teles Tavares • Maria Fernanda Guerra • Maria José Barreiro Marques • Mário Sottomayor Cardia • Mateus Mendes Branco • Nuno Brederode Santos • Orlando Pereira de Sousa • Paulo Sucena • Pedro Massano d’Amorim • Rodrigo Gentil Stromp • Rodrigo das Neves • Rui Jorge Gabriel Tamagnini • Rui Manuel Faure da Rosa • Valentim Alexandre • Vasco Manuel Veloso • Vasco Martins Reis
Fonte: Artur Pinto (coord.), 100 Dias que abalaram o regime. A crise académica de 1962. Lisboa: Tinta-da-China, 2012, p. 143-145.
No dia 21 de maio, é publicado um decreto-lei que determina que “o ministro da Educação Nacional poderá sempre ordenar procedimento disciplinar contra alunos das escolas dependentes do Ministério”.
A repressão sobre o movimento estudantil aumenta com a perseguição e a prisão de alguns dirigentes associativos: José Bernardino e Eurico Figueiredo, entre outros. Os grevistas da fome são expulsos da universidade e retiram-se apoios financeiros aos alunos que estiveram envolvidos na crise. Alguns estudantes, como Francisco Delgado, são expulsos de todas as universidades portuguesas por um período entre dois a três anos. Mas não é só a repressão a anunciar o final da crise.
PRISÃO DOS ESTUDANTES QUE SE ENCONTRAVAM NA CANTINA UNIVERSITÁRIA EM APOIO AO SEUS COLEGAS EM GREVE DE FOME.
Fonte: FMSMB- DTR.




Com a chegada da época dos exames, o risco de desmobilização dos estudantes é real. No dia 15 de junho, num plenário no Instituto Superior Técnico, é votada por maioria a suspensão do luto académico. Apesar da insatisfação de alguns estudantes, o conjunto das associações de estudantes acata a decisão tomada em plenário. A contestação perde vigor, mas continua em torno da prisão dos dirigentes – especialmente de Eurico Figueiredo – e da anulação dos processos disciplinares.

