No ano de 2024 cumpre-se o 50º aniversário da Revolução dos Cravos, que pôs fim à ditadura portuguesa (1926-1974). A 25 de Abril de 1974, na sequência do levantamento militar e do apoio popular, abriu-se, perante o povo português, um cenário de mudança, tão entusiasmante quanto incerto. Um rápido olhar sobre as transformações da época mostra a sobreposição de várias realidades: mobilizações camponesas que levaram a ocupações de terras; a implementação de políticas públicas como o Serviço Ambulatório de Apoio Local que serviu para desenvolver um modelo de planeamento urbano socialmente orientado; o início do movimento ambientalista, através de grupos como o Grupo Autónomo de Intervenção Ecológica do Porto, que se articulava fundamentalmente em torno de mobilizações anti-nucleares; e, por último, o fim do império, que provocou a migração massiva de habitantes das colónias, que, uma vez em Portugal continental, se tornaram retornados que constituíram, em plena transição, um desafio demográfico e infraestrutural para a antiga metrópole.
Estas e outras mudanças tiveram reflexos nos meios audiovisuais, pois a última revolução europeia foi sistematicamente filmada e transmitida por câmaras portuguesas e estrangeiras.
Com base numa investigação iniciada em 2022, a Filmoteca Espanhola propõe um ciclo de filmes sob a forma de uma constelação alternativa de cinema que emergiu da Revolução dos Cravos. Inclui os filmes-chave do período e, ao mesmo tempo, pretende iluminar alguns ângulos obscuros, desconhecidos e inexplorados até agora, que permitem um novo olhar sobre questões políticas de primeira grandeza, como por exemplo a Lei da Reforma Agrária, relacionando o imaginário revolucionário português com referências ao cinema amador feito nas colónias, a documentários televisivos sobre questões ecológicas, aos filmes pouco conhecidos de autores consagrados, como Rui Simões, sobre o ativismo cultural das antigas regiões mineiras, e a sobrevivência da memória revolucionária na atualidade, na perspetiva da libertação sexual e das experimentações biopolíticas do final dos anos 1970.
O ciclo consiste em várias sessões, organizadas em seis blocos temáticos, com filmes produzidos sobretudo nos anos 70 e na última década do século XX.
Portugal – Espanha: 50 anos de cultura e democracia
O ciclo “La constelación de los claveles. Imaginarios revolucionarios en Portugal” acontece no âmbito da “Programação Cultural Cruzada Portugal-Espanha – 50 anos de democracia”, um projeto resultante do protocolo de intenções assinado pelos Ministros dos Negócios Estrangeiros e da Cultura do Governo da República Portuguesa e os Ministros dos Negócios Estrangeiros, União Europeia e Cooperação e da Cultura e Desporto do Reino de Espanha para a execução de uma programação cultural conjunta, que dará particular destaque às transições para a democracia e ao contributo da cultura e das artes para o processo de democratização nos dois países.