ELEIÇÕES LEGISLATIVAS DE 1973
”Tudo indica […] que este ano de eleições será, do ponto de vista político, análogo aos anteriores”, afirmou Sá Carneiro nas páginas do jornal Expresso de 28 de Abril de 1973.
O ex-deputado contrastou este imobilismo com o clima de esperança e expectativa ao tempo das eleições legislativas de 1969. Nesse ano, a União Nacional conduziu a campanha eleitoral “sob o signo das reformas, da liberalização e do pluralismo político”, o que também se refletiu na composição da própria a Assembleia Nacional, onde três quartos dos seus membros eram deputados pela primeira vez.
Em 28 Outubro de 1973, no dia das últimas eleições legislativas do Estado Novo, o cenário era outro. Vivia-se um período de aumento de inflação, de divisões na frente militar e de um crescente isolamento internacional em virtude da guerra colonial. Ao contrário do que sucedera quatro anos antes, nas únicas eleições do Estado Novo disputadas pela oposição, as forças hostis ao regime recusaram-se a participar no acto eleitoral em virtude dos obstáculos levantados à sua actividade. Mota Amaral, Alarcão e Silva, José da Silva e Correia da Cunha foram os únicos liberais reeleitos. Tudo somado, uma certa legitimidade que Caetano retiraria das eleições de 1969 não teve paralelo nas legislativas de 1973.
ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS DE 1972
Apesar dos rumores de que Marcelo Caetano se iria candidatar às eleições presidenciais de 25 de julho de 1972 e que os liberais planeavam apresentar um candidato próprio, hipóteses que faziam antever mudanças significativas na política nacional, Américo Tomás acabou reeleito para um terceiro mandato como Presidente da República.
Segundo Sá Carneiro, tal “representa[va] o corolário daquilo que [tinha] sido a política do Governo”, o “marco definitivo” de que o Presidente do Conselho se identificava “com o regime do tempo do Dr. Salazar”. O resumia-se, portanto, àquilo que o mesmo ex-deputado designou por “um salazarismo sem Salazar”.
Deste modo, para os liberais, as eleições presidenciais de 1972 apenas reconfirmavam que o marcelismo não tinha intenções reformistas. O indício desta falta de vontade de mudança vinha de trás, pelo menos desde a discussão da revisão constitucional em 1971. Nesta ocasião, fora rejeitada uma das principais bandeiras políticas dos deputados liberais, a reposição do sufrágio universal na eleição do Presidente da República, que era então escolhido por um colégio eleitoral composto por deputados à Assembleia Nacional e procuradores à Câmara Corporativa.
ELEIÇÕES LEGISLATIVAS DE 1969
A 26 de Outubro de 1969 realizaram-se eleições para a Assembleia Nacional, o primeiro acto eleitoral após a substituição de Oliveira Salazar por Marcelo Caetano na chefia do Executivo.
O novo líder gerara grandes expectativas entre os sectores reformistas do regime, mas também entre as oposições, acreditando alguns que se caminhava para a instauração de um regime democrático de tipo parlamentar. Caetano parecia querer atrair para dentro do regime uma oposição moderada não-comunista, tendo até Mário Soares sido convidado a integrar as listas de candidatos a deputados pelo partido do Governo (o que o mesmo recusou).
Dentro deste espírito agregador, um grupo de dezanove “liberais” também foi convidado. Quatro deles, Francisco Sá Carneiro, Joaquim Macedo Correia, Joaquim Pinto Machado e José da Silva, todos do círculo eleitoral do Porto, impuseram como condição não aderirem formalmente ao partido do governo (agora designado Acção Nacional Popular) e ser publicado na imprensa um comunicado esclarecendo que tinham aceitado o convite por lhes ter sido “apontado publicamente a instauração [de um regime] de tipo europeu ocidental como meta final da sua actividade política”. Nele afirmaram ainda que a sua acção seria orientada “essencialmente no sentido da rápida e efectiva transformação política, social e económica do País”, em que “o exercício efectivo dos direitos e liberdades fundamentais consignados na Constituição e na Declaração Universal dos Direitos do Homem” era condição absoluta.
A estranheza que o comunicado causou a Marcelo Caetano levaria Sá Carneiro a querer desistir da candidatura, o que não sucedeu. Eleito deputado, só se demitiria de funções no início do ano de 1973, à medida que se foi dando conta de que “ao confronto de posições, à liberdade de acção e de discussão, à vivacidade das diferenças, substitui[u]-se gradualmente, imposta intransigentemente por uma maioria quase silenciosa que a si própria se intitula[va] de esmagadora, a uniformidade de um apoio sistemático e exclusivo ao Governo”. “Exteriormente corporativo e maurrassiano pelo interior, a lógica da imutabilidade [do regime] conduz[ia] à situação em que acaba[va] a décima legislatura” (Expresso, 28 de Abril de 1973).