Como previsto no programa do MFA, a 12 de agosto de 1974 o ministro da Comunicação Social do II Governo Provisório, o major Sanches Osório, nomeou uma comissão para redigir uma proposta de lei de imprensa. Os seus membros foram instruídos no sentido de trabalharem com rapidez para que a Comissão Ad Hoc pudesse ser dissolvida e a liberdade de imprensa garantida.
A comissão agregou uma série de personalidades com competências variadas, sobretudo da área do direito e do jornalismo. António Sousa Franco, presidente, e Rui de Almeida Mendes foram designados pelo ministro. João de Menezes Ferreira foi nomeado secretário sem direito a voto. Da comissão faziam igualmente parte representantes dos partidos da coligação governamental: Alberto Arons de Carvalho pelo Partido Socialista (PS), Marcelo Rebelo de Sousa pelo Partido Popular Democrático (PPD), Pedro Soares pelo Partido Comunista Português (PCP). Incluía ainda representantes das Associações de Imprensa Diária e Não Diária (Adriano Lucas e Francisco Pinto Balsemão) e representantes do Sindicato dos Jornalistas (José da Silva Pinto e Figueiredo Filipe).
A 13 de setembro de 1974, o trabalho da comissão foi entregue ao Governo. Segundo António Sousa Franco, que presidiu aos trabalhos, o projeto concebia a imprensa como forum de liberdade». Consagrando o direito à informação e o direito de informar, punha fim a quase meio século de restrições políticas e administrativas, ficando reservado aos tribunais comuns o julgamento dos crimes que violassem a liberdade de imprensa.


Conferência de imprensa sobre o projecto da Lei de Imprensa, 16 de setembro de 1974.
Fonte: ANTT, EPJS
Não só se rejeitava a ideia salazarista de uma imprensa fazedora de opinião pública, como também se recusava que fosse colocada ao serviço dos revolucionários de Abril.
Em traços genéricos, o projeto consagrava:
• O fim da censura e das medidas restritivas da liberdade de imprensa;
• A livre constituição de empresas jornalísticas;
• A não intervenção do Estado na nomeação dos diretores dos órgãos de comunicação;
• A existência legal dos conselhos de redação;
• A regulação da profissão de jornalista;
• A criação de uma escola de jornalismo;
• A regulação do acesso às fontes de informação;
• O sigilo profissional;
• O direito de resposta;
• A criação de um conselho de imprensa, órgão de provedoria que agregava jornalistas, proprietários, entidade políticas, e representantes da opinião pública.
O III Governo Provisório, antes de submeter o projeto ao debate público, introduziu-lhe alterações no domínio das competências dos conselhos de redação:
(a) A designação do diretor passou a necessitar do aval do conselho de redação;
(b) Os periódicos com mais de cinco jornalistas profissionais foram obrigados a ter conselho de redação;
(c) Competia-lhe cooperar na definição da orientação editorial do periódico;
(d) Competia-lhe ainda pronunciar-se sobre materiais que se relacionem com o exercício da atividade jornalística.
Já no debate público do projeto de lei de imprensa, participaram vários intelectuais, políticos e jornalistas da sociedade portuguesa, tal como Sophia de Mello Breyner, Norberto Lopes, Adelino Amaro da Costa, José Tengarrinha, Luís Francisco Rebelo, Francisco de Sousa Tavares, Urbano Duarte, João Lopes Alves, Manuel Sertório, João Bénard da Costa, Sottomayor Cardia, Rui Machete, F. Ribeiro Mello, Júlio Castro Caldas, José de Magalhães Godinho.
Segundo Sousa Franco, apenas os gráficos de A Capital e José Lechner, professor de comunicação social, se pronunciaram na generalidade contra o projeto.
«As matérias mais discutidas centraram-se, de longe, na designação do diretor do jornal, nos poderes do conselho de redação e da empresa proprietária, na definição do conteúdo da publicação (pelos órgãos editoriais e pelos jornalistas? ou também pelos gráficos e outros trabalhadores da empresa jornalística ou editorial?), no estatuto editorial e nos poderes editoriais e, ainda, nas garantias de independência perante os poderes político e económico. Era a questão central do poder no jornal que estava em causa, nas redações e na sociedade. Depois, outros problemas foram também debatidos com calor: alguns crimes de imprensa, a defesa da liberdade de imprensa e a proibição da censura ou de intervenções administrativas, o estatuto dos jornalistas e seus direitos e deveres profissionais (acesso as fontes, sigilo profissional), a defesa da intimidade e seu equilíbrio com o direito de informação publica.» (António Sousa Franco)
Por fim, nos meses de outubro e novembro, a comissão reformulou o projeto, levando em consideração o debate público e a discussão em Conselho de Ministros.
No Conselho de Ministro perfilaram-se duas correntes:
• os que defendiam a liberdade de imprensa sem restrições (Salgado Zenha, Mário Soares e Magalhães Mota);
• os que consideravam que o projeto não dava garantias de defesa da Revolução (Vasco Gonçalves e membros do Governo próximos do PCP e do MDP), defendendo o condicionamento militar da liberdade de imprensa, a permanência em funções da Comissão Ad Hoc, a integração de militares do MFA no Conselho de Imprensa e a possibilidade de apreensão judicial de publicações.
A 28 de janeiro de 1975, iniciou-se a apreciação da proposta pelo Conselho de Estado, onde predominavam as chefias político-militares. Sousa Franco, com o apoio do Ministro Vítor Alves, defendeu o projeto, enfrentando a oposição de Rui Luís Gomes (reitor da Universidade do Porto), Teixeira Ribeiro (reitor da Universidade de Coimbra), Rosa Coutinho (JSN) e José Miguel Judas (Comissão Coordenadora do MFA). Mesmo assim, por pressão do Presidente da República Costa Gomes, que queria ver a lei aprovada a tempo de estar em vigor na campanha eleitoral para a Assembleia Constituinte, o Conselho de Estado concluiu a apreciação da lei de imprensa a 8 de fevereiro.
O projeto regressaria a Conselho de Ministros, sendo aprovado a 24 de fevereiro com duas alterações:
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No artigo 66º foram proibidos e punidos os ultrajes ao Presidente da República e às instituições democráticas, as referências que instigassem à indisciplina ou minassem a coesão das forças armadas e os boatos. Os faltosos eram punidos com multas, suspensões dos títulos e, no caso de indivíduos, prisão até dois anos. Tais crimes eram, no entanto, julgados pelos tribunais comuns, o que levou a que a sua aplicação tenha sido restrita;
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No artigo 17º, incluiu-se no Conselho de Imprensa três elementos designados pelo MFA.