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Fundada em 1944, sob tutela do Ministério das Colónias e patrocínio da Mocidade Portuguesa, a Casa dos Estudantes do Império (CEI) tinha um desiderato claro: sedimentar o espírito de “unidade imperial” junto dos estudantes que, oriundos das colónias, chegavam à metrópole para prosseguir os seus estudos superiores.

A criação das Casas de Estudantes de Angola, Macau, Cabo Verde, Índia e Moçambique (entre 1943 e meados de 1944) colocou as autoridades de sobreaviso. Temia-se que, além de providenciarem camaratas e refeições a preços módicos, estas instituições pudessem constituir um alfobre de sentimentos protonacionalistas. A solução encontrada passou por agregá-las numa única “Casa”, que, em linha com a narrativa do regime, recebesse indistintamente os estudantes provenientes das diferentes possessões coloniais portuguesas, encarando-as como parte de um mesmo todo, “uno e indivisível”.

No entanto, esse projeto de enquadramento fracassaria praticamente desde a primeira hora. A CEI transformou-se rapidamente num centro de formação política e agitação antifascista, funcionando como ponto de encontro entre estudantes que, enlevados por um contexto internacional cada vez mais desfavorável à prossecução de projetos coloniais, se entregariam às lutas pela libertação nacional. Muitos dos seus elementos vão aderir ao MUD Juvenil logo em 1946, juntando-se às fileiras da oposição democrática e do Partido Comunista Português. Participariam igualmente nas lutas estudantis dos anos seguintes de forma ativa, particularmente durante a Crise de 1962. Os copiógrafos da CEI vão ser postos ao serviço dos serviços de informação e propaganda das associações de estudantes, sendo as suas instalações cedidas para reuniões da RIA e de outros organismos associativos.

Inauguração da Casa dos Estudantes do Império em Lisboa. Ao centro, Marcelo Caetano. Entre muitos não identificados, Sócrates Dáskalos (segundo na primeira fila) e Lúcio Lara (duas filas atrás de Caetano). Fonte: Associação Tchiweka de Documentação. Arquivo Lúcio Lara

Inauguração da Casa dos Estudantes do Império em Lisboa. Ao centro, Marcelo Caetano. Entre muitos não identificados, Sócrates Dáskalos (segundo na primeira fila) e Lúcio Lara (duas filas atrás de Caetano).

Fonte: Associação Tchiweka de Documentação. Arquivo Lúcio Lara

Álbum de recortes de imprensa sobre a fundação da Casa dos Estudantes de Angola e a Casa dos Estudantes do Império, coligido por Alberto Marques Mano de Lemos Mesquita. Fonte: FMSMB- FACEI
Álbum de recortes de imprensa sobre a fundação da Casa dos Estudantes de Angola e a Casa dos Estudantes do Império, coligido por Alberto Marques Mano de Lemos Mesquita. Fonte: FMSMB- FACEI

 

A atividade cultural desenvolvida na Casa espelhava também a militância e as aspirações dos seus membros. Para além dos bailes, excursões, conferências, provas desportivas e outras atividades recreativas, a CEI apostou decisivamente na publicação de obras literárias que davam expressão e corpo às identidades culturais dos territórios de onde muitos dos seus sócios eram naturais. É nas edições da CEI que encontramos a génese das literaturas nacionalistas africanas de expressão portuguesa, contando-se, no rol de autores dados à estampa pela sua imprensa, Viriato Cruz, Luandino Vieira, Pepetela, José Craveirinha ou Rui Knopfli.

Casa dos Estudantes do Império de Coimbra (1952). De pé, Campos Dias, Figueira Forte Faria, Lúcio Lara, Agostinho Neto, agachados, Carlos Mac Mahon V. Pereira e Campino. Fonte: Associação Tchiweka de Documentação - Arquivo Lúcio Lara Casa dos Estudantes do Império de Coimbra (1952). De pé, Campos Dias, Figueira Forte Faria, Lúcio Lara, Agostinho Neto, agachados, Carlos Mac Mahon V. Pereira e Campino. Fonte: Associação Tchiweka de Documentação - Arquivo Lúcio Lara
Mário Pinto de Andrade junto à porta da Casa dos Estudantes do Império, Lisboa. Fonte: FMSMB-AMPA Mário Pinto de Andrade junto à porta da Casa dos Estudantes do Império, Lisboa. Fonte: FMSMB-AMPA

Esses contos, poemas e narrativas, aliados a ensaios de cariz marcadamente anticolonial publicados nos boletins da Casa (Mensagem e Meridiano), vão contribuir para a formação política de alguns dos mais destacados quadros dos movimentos de libertação nacional. Pela CEI passaram nomes como Amílcar Cabral e Luís Cabral (fundadores do PAIGC), Agostinho Neto e Lúcio Lara (fundadores do MPLA), Marcelino dos Santos e Joaquim Chissano (FRELIMO), Alda do Espírito Santo e Miguel Trovoada (MLSTP). Jovens intelectuais que, a partir da Casa, do Centro de Estudos Africanos e do Clube dos Marítimos Africanos, estabeleceram redes de solidariedade que se estendiam além-fronteiras e que se provariam determinantes para o sucesso das lutas dos movimentos que integravam.

I Congresso de Escritores e Artistas Negros, em Paris (Sorbonne), organizado pela Présence Africaine. Distinguem-se Mário Pinto de Andrade, redator da Présence Africaine, na primeira fila, e Aimé Césaire, na mesa dos oradores. Fonte: FMSMB-AMPA I Congresso de Escritores e Artistas Negros, em Paris (Sorbonne), organizado pela Présence Africaine. Distinguem-se Mário Pinto de Andrade, redator da Présence Africaine, na primeira fila, e Aimé Césaire, na mesa dos oradores. Fonte: FMSMB-AMPA
Fotografia alusiva à crise académica de 1962, de camião de transporte de polícia de choque, tirada a partir da varanda da CEI. Lisboa, 28 de maio 1962. Fonte: FMSMB- FACEI Fotografia alusiva à crise académica de 1962, de camião de transporte de polícia de choque, tirada a partir da varanda da CEI. Lisboa, 28 de maio 1962. Fonte: FMSMB- FACEI
Manifesto do Movimento Anti-Colonialista (MAC), elaborado em 1957 e redigido na sua forma final entre 1957 e 1959. Fonte: FMSMB- AMPA Manifesto do Movimento Anti-Colonialista (MAC), elaborado em 1957 e redigido na sua forma final entre 1957 e 1959. Fonte: FMSMB- AMPA
Caricatura desenhada por José Manuel Rodrigues dos Santos, representando membros da direção da CEI. Fonte: FMSMB- FACEI Caricatura desenhada por José Manuel Rodrigues dos Santos, representando membros da direção da CEI. Fonte: FMSMB- FACEI

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