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Na reunião realizada em Cascais, a 5 de março de 1974, os Capitães assumem como irreversível a opção pelo golpe de Estado, determinam um reforço da sua organização e acionam os mecanismos para a conclusão de um projeto político que sintetiza os seus objetivos fundamentais.

 

A História do Movimento dos Capitães, rebatizado no encontro de Óbidos (1 de dezembro de 1973) como Movimento dos Oficiais das Forças Armadas, conhece um importante impulso em inícios de 1974, momento em que a opção pelo golpe de Estado ganha novos adeptos. O Movimento evolui consideravelmente em termos numéricos e organizativos, intensifica-se o debate ideológico e equaciona-se a necessidade de um programa político.

No plano militar, procede-se ao levantamento do posicionamento das principais unidades do país e da sua capacidade bélica (12 de janeiro). Da mesma forma, determina-se o estudo da situação das forças militarizadas, GNR, PSP e Guarda-Fiscal, que poderiam assumir uma posição pró-governamental (3 de fevereiro). Estes eram apenas os primeiros passos tendo em vista uma avaliação das forças em presença e que se intensificam quando é abertamente assumida a decisão de desencadear o golpe de Estado. Nesse sentido, adquirem relevância os esforços de aperfeiçoamento da estrutura do Movimento e também as iniciativas para promover o seu alargamento a todos os ramos das Forças Armadas.

Um Movimento em crescente politização

O período foi também marcado pela insistente preocupação em estabelecer as bases de um documento programático, sinal da crescente politização dos Capitães. É nesse sentido que, ainda em janeiro, a Comissão Coordenadora delega no major José Maria Moreira de Azevedo essa missão. A sua primeira proposta é apresentada e aprovada na generalidade a 26 de janeiro, numa reunião alargada da Comissão Coordenadora realizada em casa de Vasco Lourenço. Dias depois, em encontro realizado em casa de Marcelino Marques, esse primeiro consenso desaparece, perante as críticas ao projeto, nomeadamente no que diz respeito à definição dos objetivos do Movimento. Procede-se então à constituição de um novo grupo de trabalho, no qual, a par de José Maria de Azevedo e Sousa e Castro, participam dois elementos que assistiam então, pela primeira vez, a uma reunião do Movimento: Manuel da Costa Brás e Ernesto Melo Antunes.

A publicação de Portugal e o Futuro, de António de Spínola, a 22 de fevereiro, agitou profundamente a vida nacional, minando as relações entre o regime e as Forças Armadas. Assim o atestam a realização da cerimónia da “Brigada do reumático” e a posterior demissão do Chefe e Vice-Chefe de Estado Maior das Forças Armadas (Francisco da Costa Gomes e António de Spínola, respetivamente).

O Movimento também não ficou imune ao impacto da obra de Spínola, chefia militar com quem os Capitães mantinham contactos (diretos e indiretos) há algum tempo. Apesar de nem todos concordarem com as suas teses federalistas, muitos reviam-se nas críticas aí tecidas à política colonial do regime, assim como na ideia de que a solução para a guerra era política e não militar. Portugal e o Futuro transformou-se numa referência, não por ter constituído o suporte ideológico do Movimento, mas porque permitiu que muitos ultrapassem a questão do apoliticismo das Forças Armadas e, sobretudo, o complexo de oposição à prossecução da guerra.

A necessidade de um Programa

A questão que se colocava ao Movimento era a de saber se, neste novo cenário, fazia sentido elaborar um programa autónomo ou se, pelo contrário, deveria aproveitar o sucesso do ex-governador da Guiné e efetuar uma colagem ao seu programa político. É neste contexto que, a 25 de fevereiro, se realiza uma reunião em casa de Otelo Saraiva de Carvalho, em que participam os elementos da Comissão Coordenadora, da Coordenadora do Exército, delegados das principais unidades e dois delegados dos paraquedistas. Confrontados, pela comissão de redação eleita na reunião de 5 de fevereiro, com diferentes propostas de Programa, determina-se proceder a uma auscultação dos oficiais envolvidos no Movimento sobre as principais questões que se colocavam. O objetivo era encontrar um consenso que servisse de base para a elaboração de um Programa comum. O alargamento do debate, a aprovação e a difusão dos documentos revelavam-se, nesse momento, fundamentais. O processo de politização do Movimento alargava-se substancialmente.

Finalmente, a 3 de março, tem lugar um encontro restrito de representantes dos três ramos das Forças Armadas, onde se discute o texto a apresentar à assembleia do Movimento. Sobre a mesa estiveram três propostas: uma, da autoria de Costa Brás, outra do pessoal de Artilharia e uma terceira apresentada por Melo Antunes. O documento que, dois dias depois, é anunciado ao plenário do Movimento resulta da síntese dessas propostas. O debate foi intenso, nomeadamente no que respeita à questão colonial, sendo a expressão “independência” rejeitada, para desespero dos setores mais politizados que participavam no encontro.

A reunião de 5 de março, o último passo decisivo no caminho para Abril

 

Ao plenário de 5 de março acorrem cerca de 200 oficiais, em representação de mais de 600, nos quais se incluem, pela primeira vez, os ex milicianos e representantes da Força Aérea. A Armada faz-se representar por quatro elementos que participam nos trabalhos na qualidade de observadores.

O encontro clandestino é preparado com relevantes preocupações de segurança. Os presentes são inicialmente convocados para 18 cafés ou pastelarias em Lisboa, com a instrução de esperarem por um elemento de Ligação que os encaminhará para o local da sessão. O plano inicial é realizar a reunião no edifício Franjinhas, no cruzamento das ruas Castilho e Braamcamp, mas é alterado nesse mesmo dia: o destino acaba por ser o 1.º andar do número 45 da rua Visconde Luz, em Cascais, no ateliê do arquiteto Braula Reis.

Nesse pequeno espaço, cumpre-se uma etapa determinante na história do Movimento dos Capitães e para o sucesso da «Operação Viragem Histórica», que, dali por 51 dias, derrubaria uma ditadura que durava há quase meio século.

Lista dos pontos de encontro a que deviam confluir os convocados para o plenário de Cascais. Fonte: Arquivo Vasco Lourenço

A apresentação do documento de síntese – O Movimento, as Forças Armadas e a Nação – cabe a Ernesto Melo Antunes. Com um acentuado pendor ideológico, nele se denuncia a profunda crise do país e o facto de as Forças Armadas serem apresentadas como o ‘bode expiatório’ dos desastres a que a política colonial do regime conduzira, preconizando-se a ideia de que a solução dos problemas coloniais era política e não militar. Esta crítica aberta à intransigência do regime quanto à solução do problema colonial faz deste um documento precursor, que marca a passagem do Movimento dos Capitães a Movimento das Força Armadas (MFA).

O ‘Movimento’, as Forças Armadas e a Nação, documento programático aprovado no plenário de Cascais. Fonte: Arquivo Vasco Lourenço

A par da oposição da Força Aérea, cujas críticas recaem sobretudo na questão colonial, são os setores próximos de António de Spínola que maiores reservas apresentam à aprovação do documento, argumentando que a elaboração de um programa político perdera relevância depois da publicação de Portugal e o Futuro. Foi também por insistência deste setor que se procedeu a nova votação sobre os futuros chefes do Movimento, num escrutínio mais uma vez ganho por Costa Gomes.

No final, e apesar de algumas dissidências, a maioria dos presentes (111) assina o que é, sem dúvida, o primeiro projeto político do Movimento. Tratava-se de um passo fundamental para balizar os seus objetivos, mas também para condicionar quem, derrubada a ditadura, viesse a deter o poder. Na reunião de Cascais, em que se dá também um voto de confiança à Comissão Coordenadora e à direção para desenvolver todas as atividades necessárias para a preparação do golpe de Estado, decide-se ainda delegar em Melo Antunes a responsabilidade de presidir e coordenar a comissão de elaboração do Programa.

O encontro de Cascais reveste-se, assim, de grande relevância. Num momento em que o presidente do Conselho, Marcelo Caetano, se revela cada vez mais acorrentado aos ultras do regime e em que se torna óbvia a iminente demissão de António de Spínola e de Francisco da Costa Gomes, os Capitães decidem acelerar o processo. Assumindo como irreversível a opção pelo golpe de Estado, determinam um reforço da sua organização e acionam os mecanismos para a conclusão de um projeto político que sintetiza os seus objetivos fundamentais.

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